Me pus a escrever um poema pagão
sem falta, sem orçamento
pensava que queria o ritmo
batendo aos pés, dando movimento:
em dia de temporal
o malandro me saiu correndo!
Tristeza maior de quem tá lendo
sentir-se assim, meio perdido
feito anjo querubim enfeitando porta de inferno.

Perdeu-se a rima
avessou-se o avesso
e o meu amor desconexo
prostrou-se de tal maneira que...
(ah!)
parecia a velha serena
sentada ao túmulo do falecido
contando pétalas de margarida:
bem-me-quer, não-pode-mais-querer.
E assim fica o meu dizer:
não te percas se és impotente sozinho
que a solidão é sempre um espinho
pr'aquele que dorme em forro de papelão!

A dor pungente virou pingente
no pescoço da moça esbranquiçada
que sentiu-se incomodada pelo olhar do pescador
o doer quase sempre hipnotiza
feito a tristeza posta à frente do poeta
tantas as profissões e a linha certa
é que entortando é que se vai.

Vestiu-se de vestido a menininha
que tinha os dedos vermelhos de amora
manchou de sangue e, sem demora
espalhou a culpa pelas frutinhas!
E há que a culpa é sempre inocente...
gerou o caos entre os doentes
partiu e gelou os dentes
olhou de canto e foi-se embora:
sem direção, pegou o bonde
ergueu as malas, só pra desfazer
rupturas ao bom prazer
de ter-se sempre por contente.

O fato é aquele meu poema
o tal fugitivo, fora da lei
ainda, ao menos, eu me avisei:
movimento é bom enquanto está parado.
Mas quando sai entreverado
e já se confunde até o cheiro
fica o fogo no isqueiro
e a brasa queimando amarga
lá, no fundo do canteiro
onde o coração do poeta não se arrisca
ainda enquanto o velho pensamento rebusca
enchendo de baús a casa
até inverter os papéis guardáveis.

Não me termino por aqui
agitem-se os acomodados!
Saí foi pra comprar mais dados
no tal do jogo de vida
aonde o céu faísca faceiro
e que se o tiro é certeiro
nem carteiro agoniado
serve pra errar a mira.